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quarta-feira, 28 de setembro de 2016

Evágrio Pôntico - A Oração: Cento e Cinquenta e Três Textos - Parte 1/2

The Philokalia, The Complete Text, Volume One, Faber and Faber, New York, 1979, págs. 57 à 73

Prólogo

Ao sofrer do fervor de paixões imundas, meu intelecto foi afligido por pensamentos vergonhosos. Muitas vezes tive a saúde restaurada pelas tuas cartas, assim como costumava ser pelo conselho de nosso grande guia e mestre.¹ Isso não é de se preocupar, já que como o abençoado Jacó ganhaste uma rica herança. Através dos teus esforços para ter Raquel te foi dado Lia. (cf. Gn 29,25),² e agora procuras ser dado Raquel também, já que tens trabalhado por mais sete anos por causa dela.

Quanto a mim, não posso negar que ainda que eu tenha trabalhado duro toda a noite, não consegui nada. Ainda na tua sugestão, lancei de novo as redes e capturei muitos peixes. Não são grandes peixes, mas são cento e cinquenta e três deles (cf. J0 21,11). Esses, como requiriste, estou te enviando em um cesto de amor na forma de cento e cinquenta e três textos.

Estou contente de te encontrar tão ansioso por textos sobre a oração - ansioso não simplesmente por aqueles textos em papel e tinta mas também por aqueles que são fixados através do amor e da generosidade. Mas já que "todas as coisas se acham aos pares, uma complementando a outra", como o sábio Jesus colocou (Eclo 42,24), por favor aceita a carta e entende o seu espírito, já que toda palavra escrita pressupõe o intelecto, pois onde não há palavra escrita não há intelecto. O caminho da oração é também duplo: compreende a prática das virtudes e a contemplação. O mesmo se aplica aos números: literalmente eles não são quantidades, mas podem significar qualidades.

Eu divido este discurso sobre a oração em cento e cinquenta e três textos. Dessa maneira te envio um banquete evangélico tal que podes te deleitar no número simbólico que combina uma figura triangular com uma figura hexagonal.³ O triângulo indica o conhecimento espiritual da Trindade, o hexágono indica a criação ordenada do mundo em seis dias. O número cem é quadrado, enquanto o número cinquenta e três é triangular e esférico; pois vinte e oito é triangular e vinte e cinco é esférico, cinco vezes cinco sendo vinte e cinco. Desta maneira, tens uma figura quadrada para expressar a natureza quaternária das virtudes e também um número esférico, vinte e cinco, que pela forma representa o movimento cíclico do tempo e então indica o conhecimento verdadeiro dessa era presente. Pois semana segue semana, mês segue mês, e o tempo dá voltas de ano à ano, e estação segue estação, como vemos pelo movimento do sol e da lua, da primavera e verão, e assim por diante. O triângulo pode significar o conhecimento da Santíssima Trindade. Ou podes considerar a soma total, cento e cinquenta e três, como triangular e então significar respectivamente a prática das virtudes, a contemplação do divino na natureza e a teologia ou o conhecimento espiritual de Deus; fé, esperança e caridade (cf. 1Co 13,13); ou ouro, prata e pedras preciosas (cf. 1Co 3,12). Há muito a se considerar sobre este número.

Não desprezes a aparência humilde desses textos, pois sabes como estar contente com muito ou pouco (cf. Fl 4,12). Recordarás como Cristo não rejeitou as moedinhas da viúva (cf. Mc 12,44), mas aceitou-as como maiores que as ricas ofertas de muitos outros. Mostrando dessa maneira caridade e amor em direção aos teus verdadeiros irmãos, ora por quem está doente para que este possa se "levantar da cama" e andar (Mc 2,11) pela Graça de Cristo. Amém.

1. Se alguém deseja fazer incenso, deve misturar, de acordo com a Lei, estoraque, ônix, gálbano de bom cheiro, incenso lucidíssimo, em quantidades iguais (cf. Ex 30,34). Essas são as quatro virtudes. Com o pleno e balanceado desenvolvimento delas, o intelecto estará salvo da traição.

2. Quando a alma é purificada através da conservação de todos os mandamentos, ela faz o intelecto firme e capaz de receber o estado necessário para a oração.

3. A oração é a comunhão do intelecto com Deus. Qual estado, então, o intelecto necessita para que possa alcançar o seu Senhor sem desvio e comunhão com Ele sem intermediário?

4. Quando Moisés tentou se aproximar da moita que queimava, foi proibido de se aproximar até que ele tivesse largado as sandálias de seus pés (cf. Ex 3,5). Se, então, desejares contemplar e se aproximar Dele, que está além da percepção dos sentidos e além do que se concebe, deverás te libertar de todo pensamento apaixonado.

5. Primeiro reza pela dádiva das lágrimas para que através do sofrimento possas domar o que é selvagem na tua alma. E tendo confessado tuas transgressões ao Senhor, obterás perdão Dele.

6. Reza com lágrimas e tudo o que pedires será ouvido. Pois o Senhor se rejubila enormemente quando rezas com lágrimas.

7. Se derramares lágrimas durante a tua oração, não te exaltes, pensando que és melhor que os outros. Pois tua oração recebeu ajuda para que possas confessar teus pecados prontamente e fazer as pazes com o Senhor através das tuas lágrimas. Portanto não tornes o remédio para as paixões numa paixão que novamente provoca a ira Dele, de quem recebeste esta graça.

8. Muitas pessoas, derramando lágrimas pelos seus pecados, esquecem para que servem as lágrimas, e então em sua loucura vão para o mau caminho.

9. Persevera com paciência na tua oração e repele as preocupações e dúvidas que surgem dentro de ti. Elas te perturbam e te atrapalham, e então afrouxam a intensidade da tua oração.

10. Quando os demônios veem que claramente anseias pela oração, sugerem uma necessidade imaginária por várias coisas e então fomenta tua rememoração dessas coisas, incitando o intelecto a segui-las; e quando ele falha em encontrá-las, torna-se depressivo e miserável. E quando o intelecto está em oração, os demônios continuam preenchendo-o com o pensamento dessas coisas, para que ele tente descobrir mais sobre elas e então perder a fruitividade de sua oração.

11. Tenta fazer teu intelecto surdo e mudo durante a oração; então serás capaz de rezar.

12. Qualquer seja a tentação ou o sentimento de contentamento vindo sobre ti, levando-te imediatamente a raiva ou a alguma palavra insensível, lembra da tua oração e como serás julgado acerca dela, e o movimento desordenado dentro de ti sucumbirá de uma vez.

13. O que quer que faças para te vingar contra um irmão que te fez algo errado provará ser uma pedra no teu caminho durante a oração.

14. A oração é a flor da gentileza e da liberdade da raiva.

15. A oração é o fruto da alegria e gratidão.

16. A oração é o remédio para a melancolia e o desânimo.

17. "Vá e vende tudo o que tens e dá aos pobres" (Mt 19,21); e "nega-te a ti mesmo, toma a tua cruz" (Mt 16,24). Serás então liberto da distração quando rezares.

18. Se desejas rezar como deverias, nega-te a ti mesmo toda a vez, e quando qualquer tipo de aflição te incomodar, medita na oração.

19. Se suportares algo doloroso por amor à sabedoria, acharás o fruto deste durante a oração.

20. Se desejas rezar como deverias, não ofendes ninguém; caso contrário "corres em vão" (Fp 2,16).

21. "Deixa a tua oferta dante do altar, primeiro vá e reconcilia-te com teu irmão" (Mt 5,24), e quando retornares rezarás sem distúrbio. Pois o rancor escurece o intelecto de quem reza e extingue a luz de suas orações.

22. Aqueles que guardam ofensas e rancor neles mesmos são como pessoas que se aproximam da água e a colocam em um tonel cheio de furos.

23. Se tu pacientemente aceitares o que te acontecer, sempre rezarás com alegria.

24. Quando rezares como deverias, pensamentos chegarão a ti que o farão sentir que tens um real direito de estar com raiva. Mas a raiva com o teu próximo nunca é correto. Se procurares, descobrirás que as coisas podem sempre ser resolvidas sem raiva. Assim faze tudo o que puderes para não caíres na raiva.

25.  Toma cuidado de, quanto parecer que curas alguém, tu mesmo não permaneceres não curado, deste modo frustrando tua oração.

26. Se tu estiveres dando socos na tua raiva, serás tu mesmo socado, mostrarás teu bom senso e serás um daqueles que rezam.

27. Se te armas contra a raiva, então nunca sucumbirás a qualquer tipo de desejo. O desejo provê gasolina para a raiva, e a raiva perturba a visão espiritual, rompendo o estado da tua oração.

28. Não rezes apenas com formas e gestos exteriores, mas com reverência e com temor fazer teu intelecto consciente da oração espiritual.

29. Algumas vezes tanto mais cedo quanto começas a rezar, melhor rezas, noutras vezes, apesar da grande empenho, não atinges teu objetivo. Isso é para te fazer com que empenhes-te a t mesmo ainda mais para que, tendo adquirido a dádiva da oração, a mantenhas segura.

30. Quando um anjo chega até nós, tudo o que nos incomoda se retira de uma vez; então o intelecto é completamente acalmado e reza sadiamente. Mas noutras vezes, quando os ataques do demônio são particularmente fortes, o intelecto não tem um momento de repouso. Isso é porque ele está enfraquecido pelas paixões para as quais ele sucumbiu no passado. Mas se continuar procurando, ele achará; e se bater, a porta será aberta (cf. Mt 7,8).

31. Não rezes pelo cumprimento de teus desejos, pois eles podem não estar de acordo com a vontade de Deus. Mas reza como foste ensinado, dizendo: Tua vontade seja feita em mim (cf. Lc 22,42). Sempre lhe suplica dessa maneira - que a Sua vontade seja feita. Pois Ele deseja o que é bom e lucrativo para ti, enquanto que não pedes sempre por isso.

32. Muitas vezes quando eu rezei, pedi pelo que pensava que era bom, e persistia em minha petição, estupidamente importunando a vontade de Deus e não Lhe deixando arrumar as coisas como Ele sabe ser melhor para mim. Mas quando obtive o que pedia, ficava muito arrependido de que eu não pedi para a vontade de Deus ser cumprida; porque a coisa acabava por não estar como eu pensei.

33. Quem é bom, com exceção de Deus? Então deixemos para Ele tudo que nos preocupa e tudo estará bem. Porque Ele que é bom é naturalmente também um doador de boas dádivas.

34. Não estejas aflito se não recebeste de Deus o que pediste. Ele deseja te dar algo melhor - para te fazer perseverar na tua oração. Pois o que é melhor do que aproveitar o amor de Deus e estar em comunhão com Ele?

35. A oração não distraída é a mais alta intelecção do intelecto.

36. A oração é a elevação do intelecto à Deus.

37. Se anseias pela oração, renuncia tudo para ganhar tudo.

38. Reza primeiro pela purificação das paixões, segundo, pela libertação da ignorância e do esquecimento; e terceiro, pela libertação de toda a tentação, provação e desamparo.

39. Na tua oração persegue somente a justiça e o Reino de Deus, isto é, a virtude e o conhecimento espiritual; e tudo o mais "vos será dado" (Mt 6,33).

40. É correto rezar não apenas pela tua própria purificação, mas também pela de todos os teus companheiros, e assim imitar os anjos.

41. Observa se te posicionas diante de Deus na tua oração ou se és vencido pelo desejo por louvor humano, usando a oração prolongada como um disfarce.

42. Seja rezando com os irmãos ou sozinho, tenta rezar não simplesmente como rotina, mas com consciência de tua oração.

43. A consciência da oração é concentração acompanhada por reverência, compunção e aflição da alma assim que ela confessa seus pecados com sofrimento interior.

44. Se teu intelecto ainda está distraído durante a oração, não sabes ainda o que é rezar como monge; mas tua oração ainda está mundana, enfeitando o tabernáculo exterior.

45. Quando rezares, mantém estrita atenção sobre a memória para que ela não te distraia com lembranças do passado. Mas torna-te ciente de que estás posicionado diante de Deus. Por natureza o intelecto é apto a ser arrebatado pelas memórias durante a oração.

46. Enquanto estás rezando, a memória traz diante de ti fantasias quaisquer de coisas passadas ou de preocupações recentes ou da face de alguém que te irritou.

47. O demônio é muito invejoso de nós quando rezamos e utiliza todo o tipo de truque para frustrar nosso propósito. Portanto ele está sempre utilizando nossa memória para incitar os pensamentos de várias coisas e a nossa carne para despertar as paixões, de maneira a obstruir nosso caminho de ascensão à Deus.

48. Quando depois de muitas tentativas o demônio astuto falha em impedir a oração do homem justo, ele afrouxa um pouco seus esforços e então o agarra pelas próprias costas quando o homem terminou de rezar. Ou ele provoca no homem a raiva e assim destrói os bons efeitos da oração ou então o excita pelo prazer insensato, e assim degrada o seu intelecto.

49. Tendo rezado como devias, espera pelo ataque do demônio; então posiciona em guarda, pronto para proteger os frutos da tua oração. Pois isso desde o começo foi tua tarefa apontada: cultivar e proteger (cf Gn 2,15). Portanto, tendo cultivado, não deixes os frutos desprotegidos; caso contrário não adquirirás nada da tua oração.

50. A batalha entre nós e os demônios é travada unicamente na conta da oração espiritual. Pois a oração é extremamente odiosa e ofensiva para eles, já que ela nos conduz a salvação e a paz.

51. O que é que os demônios desejam nos excitar? Glutonia, incastidade, avareza, ira, rancor e o resto das paixões para que o intelecto cresça rude e não possa rezar como deve. Pois quando as paixões estão despertas na parte não-racional de nossa natureza, elas não permitem o intelecto funcionar apropriadamente.

52. Praticamos as virtudes de maneira a atingir a contemplação das essências interiores das coisas criadas e disso passarmos a contemplação do Logos, que as dá o ser próprio delas; e Ele se manifesta quando estamos em estado de oração.

53. O estado de oração é um de despaixão, o qual pela virtude do intensíssimo amor transporta ao reino noético o intelecto que anseia por sabedoria.

54. Quem deseja rezar verdadeiramente não deve apenas controlar suas potências irascível e concupiscível, mas deve também se libertar de todo pensamento apaixonado.

55. Quem ama a Deus está sempre e comunhão com Ele como o seu Pai, repudiando todo pensamento apaixonado.

56. Aquele que adquiriu a despaixão não necessariamente atingiu a pura oração. Pois ele pode ainda estar ocupado com pensamentos que, ainda desapaixonados, o distraem e o mantém longe de Deus.

57. Quando o intelecto não mais flerta com pensamentos desapaixonados sobre várias coisas, não necessariamente ele chegou ao domínio da oração; pois ele ainda pode estar contemplando as essências interiores dessas coisas. E mesmo que tal contemplação seja desapaixonada, ainda que seja de coisas criadas, ela imprime suas formas sobre o intelecto e o mantém longe de Deus.

58. Se o intelecto não se levantou acima da contemplação do mundo criado, ainda não observa o Reino de Deus perfeitamente. Pois ele pode estar ocupado com o conhecimento das coisas inteligíveis e muito envolvido em sua multiplicidade.

59. Se desejas rezar, tens necessidade de Deus, "que dá oração a quem reza" (1Sm 2,9 LXX). Invoca-o, então, dizendo: "Santificado seja o Teu nome, venha o Teu reino" (Mt 6,9-10) - isto é, o Espírito Santo e Teu Filho Unigênito. Pois assim ele nos ensinou, dizendo: "Adorai o Pai em espírito e em verdade."

60. Quem reza em espírito e em verdade não mais é dependente das coisas criadas quando honra o criador, mas louva à Deus e em Deus.

61. Se és um teólogo, rezarás verdadeiramente. E se rezas verdadeiramente, és um teólogo.

62. Quando teu intelecto em sua grande ânsia por Deus gradualmente se retira da carne e vira as costas para todos os pensamentos que têm sua fonte na tua percepção dos sentidos, na memória o no temperamento corpo-alma, e quando ele se torna cheio de reverência e alegria, então podes concluir que estás próximo às fronteiras da oração.

63. O Espírito Santo, por compaixão à nossa fraqueza, chega a nós mesmo quando estamos impuros. E se somente Ele encontra nosso intelecto verdadeiramente rezando para Ele, Ele entra e o coloca para escapar de toda a gama de pensamentos e ideias circulando dentro dele, e Ele o desperta para uma ânsia por oração espiritual.

64. Enquanto tudo o mais produz pensamentos, ideias e especulações no intelecto através das mudanças no corpo, o Senhor faz o oposto: ao entrar no intelecto, Ele o enche com qualquer conhecimento que Ele desejar. e através do intelecto Ele acalma os impulsos incontrolados do corpo.

65. Quem quer que ame a verdadeira oração e ainda se torne irado ou cheio de ressentimento é seu próprio inimigo. Ele é como o homem que quer enxergar claramente e ainda inflige dano nos seus próprios olhos.

66. Se anseias por rezar, não fazes nada que é oposto à oração, assim Deus pode se aproximar e estar contigo.

67. Quando estiveres rezando, não corte dentro de ti nenhuma imagem da Divindade e não deixes teu intelecto estar estampado com a impressão de nenhuma forma; mas se aproxima do Imaterial de maneira imaterial, e então entenderás.

68. Está em tua guarda contra as artimanhas dos demônios. Enquanto estás rezando pura e calmamente, algumas vezes eles subitamente trazem diante de ti alguma forma estranha e de fora, fazendo-te imaginar em tua concepção que a Divindade está lá.

69. Quando o demônio invejoso falha em incitar nossa memória durante a oração, ele perturba o temperamento corpo-alma para formar alguma estranha fantasia no intelecto. Como o intelecto que está preocupado com pensamentos é facilmente divertido: em vez de buscar conhecimento imaterial e desprovido de forma, é enganado, confundindo fumaça com luz.

70. Está em guarda e protege teu intelecto dos pensamento enquanto rezares. Então teu inteleto completará sua oração e continuará na tranquilidade que lhe é natural. Desta maneira Ele, que tem compaixão do ignorante, virá a ti e receberás a dádiva abençoada da oração.

71. Não podes atingir a pura oração enquanto estás embaraçado nas coisas materiais e agitado por preocupações constantes. Pois a oração significa o desprendimento dos pensamentos.

72. Um homem que está atado não pode correr. Nem pode o intelecto que é um escravo da paixão perceber o domínio da oração espiritual. Pois ele é arrastado pelos pensamentos apaixonados e não pode ficar parado.

73. Quando o intelecto atinge a oração que é pura e livre de paixão, os demônios não atacam mais com pensamentos sinistros, mas com pensamentos que são bons. Pois eles lhe sugerem uma ilusão da glória de Deus numa forma prazerosa aos sentidos, para fazê-lo pensar que ele realizou a finalidade última da oração. Um homem que possui conhecimento espiritual disse que essa ilusão resulta da paixão da autoestima e do toque do demônio numa certa área do cérebro.

74. Acho que o demônio, tocando nesta área, altera a luz que rodeia o intelecto como ele quer. Desta maneira, ele utiliza a paixão da autoestima para incitar no intelecto um pensamento que estupidamente atribui forma e localização ao conhecimento divino e principal. Não estando perturbado pelas paixões impuras e carnais, mas supondo a si mesmo estar em um estado de pureza, o intelecto imagina que não existe mais nenhuma energia adversa dentro dele. Ele assim confunde com uma manifestação divina a aparência produzida nele pelo demônio, que astutamente manipula o cérebro e converta a luz que rodeia o intelecto em uma forma, como acabamos de descrever.

75. Quando o anjo de Deus vêm até nós, com sua presença apenas ele coloca um fim à toda energia adversa dentro do intelecto e faz a luz deste se energizar sem ilusão.

76. A afirmação no Apocalipse de que o anjo trouxe incenso e o ofereceu com as orações dos santos (cf. Ap 8,3) se refere, eu acho, a esta graça que é energizada através dos anjos. Pois ela instila o conhecimento da verdadeira oração para que o intelecto permaneça firme, livre de toda a agitação, indiferença e negligência.

 ______
¹ São Macário de Alexandria.
² Aqui Lia simboliza a prática das virtudes, e Raquel a contemplação.
³ V. Comentário: Evágrio Pôntico e os 153 textos sobre a oração (NT).


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